Preâmbulo
Estas notas de ensinamentos, dados pela Senhora Blavatsky no final da sua vida, já foram publicadas diversas vezes, num grande número de revistas. Foram escritas por um oficial de marinha, Robert Bowen, que, numa idade já avançada, foi admitido no círculo da Senhora Blavatsky, a quem interrogou com persistência sobre a atitude que um estudante deveria ter em relação a A Doutrina Secreta. Anotou com cuidado as respostas que ela lhe foi dando, as quais, em seguida, lhe lia, a fim de se assegurar de que as tinha entendido bem.
Estas notas foram primeiramente publicadas na revista Theosophy in Ireland (número de Janeiro-Março de 1932), por diligência do Capitão P. G. B.
Bowen (filho de Robert), que nessa altura era membro da Sociedade Teosófica em Dublin. Essa publicação verificou-se, exactamente, quarenta anos depois de as mesmas terem sido tomadas.
O valor das anotações de Bowen é acrescido pelo facto de conterem princípios que não se aplicam somente ao estudo d’A Doutrina Secreta mas, igualmente, a todos os estudos teosóficos.
Afirmam e reafirmam que nenhuma Teosofia descritiva deve ser tomada necessariamente como uma imagem correcta do Universo. Ela é antes como que um modelo secundário, trazido à existência no curso da experimentação de uma Verdade que está para além das palavras, para além das descrições e para além dos valores relativos. Uma tal Teosofia não visa retratar a Verdade mas, sim, conduzir a Ela.
Seguindo esta concepção, ver-se-á que o valor e a autoridade de qualquer Teosofia descritiva não devem necessariamente ser avaliados conforme ela esteja de acordo com os factos ou com os princípios científicos ou com a Teosofia proposta por uma outra pessoa. O valor de qualquer exposição teosófica deve residir na profundidade da experiência para a qual ela pode conduzir o estudante que seja bastante forte e ousado para ir além da forma, até à realidade oculta ou escondida.
Um outro conselho que ressalta destas notas, para que sejam plenamente entendidas, é que qualquer ensinamento teosófico deve ter um enquadramento universal. Como auxílio para se chegar lá, a Senhora Blavatsky recomendava vivamente que o estudante procurasse atingir uma profunda compreensão das três proposições fundamentais que se encontram no Proémio d’A Doutrina Secreta. Essas proposições estão reproduzidas neste trabalho, a seguir às notas, para consulta e estudo mais facilitados.
H.S.
A Doutrina Secreta e o Seu Estudo
No decurso da semana, H. P. B. fez considerações especialmente interessantes sobre o tema d’A Doutrina Secreta. Gostaria de tentar triar tudo aquilo e passá-lo, em segurança, para o papel, não obstante se encontrar ainda bem presente na minha mente. Como ela própria disse, “aquilo poderia ser útil, passados trinta ou quarenta anos”.
Antes de mais, A Doutrina Secreta não é senão uma parte da Doutrina Esotérica conhecida pelos membros superiores das Fraternidades Ocultas. No entanto, diz ela, possui exactamente tanto conteúdo quanto aquele que possa ser assimilado pelo Mundo, durante o próximo século. Isto levantou uma questão, que ela explicou como se segue:
O “Mundo” significa o Homem que vive na Natureza Pessoal vulgar. Este “Mundo” encontrará, nos dois volumes d’A Doutrina Secreta, tudo quanto pode abarcar a sua máxima compreensão, mas nada mais. Isto, porém, não significa que o Discípulo que não vive no “Mundo” não possa encontrar neste livro mais do que aquilo que o “Mundo” lá encontra. Toda a forma, por imperfeita que seja, contém, oculta em si, a imagem do seu “criador”. Do mesmo modo, a obra de um autor, por obscura que seja, contém a imagem oculta do saber desse autor.
Deduzo, a este propósito, que A Doutrina Secreta deve conter tudo o que sabe a própria H. P. B. e ainda muito mais, uma vez que grande parte desta obra provém de Homens cujo saber é extremamente mais extenso do que o dela.
Por outro lado, ela quis dizer, sem nenhuma dúvida, que outra pessoa pode muito bem encontrar n’A Doutrina Secreta um conhecimento que ela própria (H.P.B.) não possui. É uma ideia estimulante pensar que nós podemos encontrar nas palavras de H.P.B. um conhecimento do qual ela própria não tem consciência. Na verdade, ela debruçou-se extensamente sobre esta ideia. “X” disse, em seguida: “H.P.B. deve estar a perder o seu punho”, querendo com isso dizer, penso eu, que ela estava a perder a confiança no seu próprio saber. Creio, todavia, que “Y”, “Z” e eu próprio também vemos melhor o que ela quer significar. Ela diz-nos, sem lugar a dúvidas, que não devemos agarrarmo-nos a ela como autoridade final, nem a qualquer outra pessoa, mas sim depender inteiramente das nossas próprias percepções crescentes.
(Observação feita mais tarde sobre o que precede: eu tinha razão – coloquei-lhe directamente a questão e ela sacudiu a cabeça sorrindo. É gratificante obter o seu sorriso aprovador! (Assinado: Robert Bowen).)
Por fim, preparámo-nos para que H. P. B. nos dissesse como estudar correctamente A Doutrina Secreta. Escrevo enquanto tudo está ainda muito fresco na minha mente.
Ler A Doutrina Secreta página a página, como se lê qualquer outro livro – diz ela – não trará senão confusão. A primeira coisa a fazer, ainda que isso requeira anos, é reter alguma coisa das “Três Proposições Fundamentai” que constam do Proémio. Fazei seguir este estudo da Recapitulação (os pontos numerados no Resumo do Volume I, Primeira Parte). Depois leiam-se as Notas Preliminares (Volume II) e a Conclusão (final do Volume II). [Estas referências reportam-se à edição inglesa d’A Doutrina Secreta. Na edição em língua portuguesa, da Editora Pensamento, dividida em mais volumes, o “Resumo” encontra-se no fim do Volume I, páginas 301 a 327; as “Notas Preliminares” no início do Volume III, páginas 15 a 25; e a Conclusão, no final do Volume I, páginas 362 a 366. O “Proémio” situa-se entre as páginas 71 a 89 do Volume I, ocupando especificamente as “Três Proposições Fundamentais” as páginas 81 a 87. Nota do Tradutor].
H.P.B. parece bem segura sobre a importância do ensino (na Conclusão) referente às alturas do surgimento das Raças e Sub-Raças. Afirma, de maneira mais simples do que lhe é usual, que não existe, na realidade, nada como uma futura ‘vinda’ de raças. “Não há nem ‘vinda’, nem ‘desaparecimento’, mas eterna ‘transformação’”, diz ela. A Quarta Raça-Raiz ainda vive. E também a Terceira, a Segunda e a Primeira ainda existem, no sentido de que as suas manifestações sobre o nosso actual plano de substância estão presentes. Penso saber o que ela quer dizer mas está para lá da minha capacidade exprimi-lo por palavras. Mesmo a Sexta Sub-Raça está aqui, tal como as Sexta e a Sétima Raças-Raiz, e mesmo os seres das Rondas que virão. Ao fim e ao cabo, é compreensível. Os Discípulos, os Irmãos e os Adeptos não podem ser gente da banal Quinta Sub-Raça, porque a Raça é um estado de evolução.
Entretanto, ela não deixou nenhuma dúvida de que, no que diz respeito à humanidade no seu conjunto, centenas de anos (no tempo e no espaço) nos separam mesmo da Sexta Sub-Raça. Pareceu-me que H.P.B. mostrava uma certa ansiedade na sua insistência sobre este ponto. Fazia alusão aos “perigos e ilusões” advindos da ideia de que a Nova Raça tinha começado no mundo de uma maneira definitiva. Segundo ela, a duração duma Sub-Raça para a humanidade no seu conjunto coincide com a do Ano Sideral (o círculo descrito pelo eixo da Terra, cerca de 25.000 anos). Isso adia a nova raça para bem longe (1).
Durante as três últimas semanas, temos tido notáveis sessões acerca do estudo d’A Doutrina Secreta. Preciso tirar as minhas notas e pô-las em segurança por escrito, antes que as perca.
Ela tem falado muito sobre o “Princípio Fundamental”: “Se se imagina poder obter d’A Doutrina Secreta um quadro completo sobre a constituição do Universo, apenas se retirará confusão do estudo do livro. Ele não se destina a dar um tal veredicto definitivo sobre a existência, mas a conduzir à verdade”. H.P.B. repetiu esta expressão em várias ocasiões.
Diz ela que é pior do que inútil ir ter com aqueles que se imagina serem estudantes avançados e pedir-lhes que nos dêem uma ‘interpretação’ d’A Doutrina Secreta. Eles não o podem fazer. Se tentam, tudo o que dão são exposições exotéricas fragmentadas que não se assemelham à Verdade, nem de longe. Aceitar uma tal interpretação conduz a agarrar-se a ideias rígidas, enquanto a Verdade está para além de qualquer ideia que se possa formular ou exprimir. As interpretações exotéricas podem ser todas muito boas, e ela não as condena na medida em que sejam tomadas como marcos indicadores para os principiantes, e não sejam por eles aceites como mais do que isso. Muitas pessoas que estão na Sociedade Teosófica, ou que lá estarão no futuro, são naturalmente incapazes, potencialmente, de ir além de uma concepção exotérica comum. Mas há e haverá outras que são capazes disso, e é para estas últimas que ela indica a maneira conveniente de tomar contacto com A Doutrina Secreta, que é exposta a seguir.
Cheguem à A Doutrina Secreta, diz ela, sem nenhuma esperança de aí obter a Verdade final sobre a existência ou com qualquer outra ideia que não seja a de ver até onde ela pode conduzir à Verdade. Vejam no seu estudo um meio de exercitar e de desenvolver o mental, nunca conseguido com outros estudos. Observem as seguintes regras:
“Seja o que for que se possa estudar n’A Doutrina Secreta, que o mental retenha firmemente, como base da sua ideação, as ideias seguintes:
a) A unidade fundamental de toda a existência. Esta unidade é uma coisa realmente diferente da noção comum de unidade, como quando se diz que uma nação ou um exército estão unidos ou que este planeta está unido a outro por linhas de força magnética ou qualquer coisa semelhante. Isso não é o ensino. A existência é uma coisa em si mesma e não um conjunto de coisas ligadas entre si. Fundamentalmente, há um Ser. O Ser tem dois aspectos, um positivo, outro negativo. O positivo é o Espírito ou a Consciência. O negativo é a Substância, o objecto da consciência. Este Ser é o Absoluto, na sua manifestação primária. Sendo absoluto, não há nada fora dele. É Todo-Ser. É indivisível, sem o que não seria absoluto. Se uma parte pudesse ser separada, o que restaria não poderia ser absoluto, porque surgiria logo a questão da comparação entre ele e a parte separada. A comparação é incompatível com a ideia de absoluto. É, então, claro que esta Existência Una fundamental, ou Ser Absoluto, deve ser a Realidade, em toda a sua forma.
Eu [R.B.] disse que, se bem que isto seja claro para mim, não pensava que muitas pessoas, nos Ramos [da Sociedade Teosófica], o compreendessem. Ela respondeu que “A Teosofia é para aqueles que podem pensar ou para aqueles que podem vir a pensar, não para os preguiçosos mentais”. H.P.B. tornou-se recentemente muito doce. ‘Crânio espesso’ era o nome que ela usava para o estudante médio.
O Átomo, o Homem, Deus, diz ela, são, cada um separadamente, bem como todos colectivamente, o Ser Absoluto, na sua última instância, ou seja a sua Individualidade Real. É esta ideia que é preciso ter constantemente no plano de fundo do mental para formar a base de toda a concepção que surja do estudo d’A Doutrina Secreta. Se isso for esquecido (e nada é mais fácil, quando se está perante um dos numerosos aspectos complicados da Filosofia Esotérica), sobrevém a ideia de Separação e o estudo perde o seu verdadeiro valor.
b) A segunda ideia que é preciso perceber seguramente é que não há matéria morta. O menor átomo está vivo. Não pode ser de outra maneira, pois que todo o átomo é, ele próprio, fundamentalmente, o Ser Absoluto. Não há, portanto, tais coisas como ‘espaços’ de Éter ou Akāśa, chamem-lhe como quiserem, onde anjos e elementais nadariam como trutas na água. É uma ideia errada. A ideia verdadeira é que cada átomo de substância, não importa em que plano, é, em si mesmo, uma Vida.
c) A terceira ideia de base a reter é que o Homem é o Microcosmo. Sendo-o, então, todas as Hierarquias dos Céus existem nele. Entretanto, não há, na verdade, nem Macrocosmo, nem Microcosmo mas, sim, Uma Existência. Grande e pequeno só são considerados como tais porque são vistos por uma consciência limitada.
d) A quarta e última ideia de base a conservar é a que está expressa no Grande Axioma Hermético. Com efeito, ela resume e sintetiza todas as outras:
O Exterior é como o Interior, o Pequeno é como o Grande; o que está em baixo é como o que está em cima. Não há senão Uma Vida e Uma Lei, e o que a acciona é Um. Nada é Interior, nada é Exterior; nada é Grande, nada é Pequeno; nada é Alto, nada é Baixo na Economia Divina.
Seja o que for que se tome como estudo n’A Doutrina Secreta, é preciso ligá-lo a estas ideias de base.”
Sugeri que isto é uma espécie de exercício mental que deve ser extremamente fatigante. H.P.B. sorriu e aprovou com a cabeça. Não se deve ser insensato, diz ela, e tomar o caminho do asilo dos alienados, tentando fazer demasiado ao princípio. O cérebro é o instrumento da consciência de vigília e todo o quadro mental que se forma provoca uma mudança e uma destruição dos átomos cerebrais. A actividade intelectual vulgar segue caminhos já abertos no cérebro e não o obriga a rápidos ajustamentos e a destruições da sua substância. Mas este novo tipo de esforço mental provoca uma coisa muito diferente. Abre ‘novos caminhos cerebrais’ e produz uma ordem diferente de disposição das pequenas vias cerebrais. Se tal for feito sem parcimónia, pode provocar-se um sério dano físico ao cérebro.
Este modo de pensar, diz ela, é o que os indianos chamam Jñāna Yoga. Quando se fazem progressos no Jñāna Yoga, vêem-se surgir concepções que, se bem que se esteja consciente delas, não se conseguem expressar nem mesmo formular em qualquer imagem mental. À medida que o tempo passa, estas concepções virão, então, a tomar a forma de imagens mentais. É o momento em que é preciso estar bem alerta e não se deixar iludir, acreditando que a maravilhosa nova imagem encontrada deve efectivamente representar a realidade. Não é assim. Continuando a trabalhar, apercebe-se que a imagem que anteriormente se admirava torna-se baça e não satisfatória, para, finalmente, se desvanecer, ou ser rejeitada. Existe, então, um novo momento crítico, porque, durante algum tempo, é-se deixado no vazio, sem nenhuma concepção para se sustentar, podendo bem ser-se tentado a revivificar a imagem rejeitada, à falta de uma melhor a que se agarrar. Entretanto, o verdadeiro estudante continuará a trabalhar sem ser perturbado e novos vislumbres rapidamente surgirão, os quais, com o tempo, darão origem a uma imagem maior e mais bela do que a precedente. O aluno, contudo, saberá agora que nenhum quadro jamais representará a Verdade. Também esta última esplêndida imagem se embaciará e desvanecerá como as outras e o processo continuará, até que, por fim, o mental e as suas imagens sejam transcendidos e o estudante penetre, para aí viver, no Mundo Sem Forma (do qual todas as formas são reflexos limitados).
O verdadeiro estudante d’A Doutrina Secreta é um Jñāna Yogin e esta Senda de Yoga é a Senda Verdadeira para o estudante ocidental. É para lhe fornecer os marcos indicadores desta Senda que A Doutrina Secreta foi escrita.
(Nota posterior: Reli este rascunho do seu ensinamento a H.P.B. e perguntei-lhe se o tinha compreendido bem. Ela tratou-me por ‘crânio espesso’ estúpido e disse-me que era bem tolo por imaginar que, seja o que for, possa alguma vez ser exprimido por palavras. No entanto, sorriu e aprovou mesmo, com a cabeça, dizendo-me que, na verdade, eu o tinha compreendido melhor do que até aí tinha acontecido e melhor do que ela própria o teria feito).
Pergunto-me por que escrevi tudo isto. Dever-se-ia transmiti-lo ao mundo mas sou demasiado velho para o fazer. Entretanto, sinto-me, de facto, uma criança em relação a H.P.B., ainda que tenha, em anos concretos, vinte anos mais do que ela.
Ela mudou muito desde que a conheci, há dois anos. É maravilhoso ver como fez face a uma doença cruel. Para alguém que não soubesse nada e não acreditasse em nada, H.P.B. transmitiria a convicção de que se trata de qualquer coisa fora e para além do corpo e do cérebro. Sinto, em especial desde as últimas conversas que tivemos – ainda que ela se tenha tornado, do ponto de vista físico, notoriamente enfraquecida –, que recebemos ensinamentos que provêm de uma esfera diferente e mais elevada. Parece-nos sentir e Saber o que ela diz, mais do que ouvi-lo com os nossos ouvidos de carne. ‘X’ fez exactamente a mesma observação a noite passada.
19 de Abril de 1891
Robert Bowen
As Três Proposições Fundamentais
(Extracto do Proémio d’A Doutrina Secreta)
PRIMEIRA
Um Princípio omnipresente, Eterno, Ilimitado e Imutável, sobre o qual toda a especulação é impossível, dado que transcende o poder da concepção humana e não pode ser traduzido por qualquer expressão ou comparação humana. Está para além do alcance do pensamento; é, segundo a expressão do Mandukya-Upanishad, ‘impensável e indizível’.
Para que se possa compreender mais claramente estas ideias, deve o leitor adoptar como ponto de partida o seguinte postulado: há uma Realidade Absoluta, anterior a tudo o que é manifestado ou condicionado. Esta Causa Infinita e Eterna, vagamente formulada no “Inconsciente” e no “Incognoscível” da filosofia europeia em voga, é a Raiz sem Raiz de “tudo quanto foi, é e será”. É, naturalmente, desprovida de todo e qualquer atributo e permanece essencialmente sem nenhuma relação com o Ser manifestado e finito. É a “Asseidade”, mais propriamente que o Ser; é Sat em sânscrito, e está fora do alcance de todo o pensamento ou especulação.
Esta Asseidade é simbolizada, na Doutrina Secreta, sob dois aspectos. Por um lado, o Espaço Abstracto Absoluto, representando a subjectividade pura, aquilo que nenhuma mente humana pode excluir de qualquer concepção nem, tampouco, consegue conceber como existente em si mesmo. Por outro lado, o Movimento Abstracto Absoluto, que representa a Consciência Incondicionada. Mesmo os nossos pensadores ocidentais mostraram que a consciência, considerada sem mutação, é inconcebível para nós, se que o Movimento é o melhor símbolo dessa mutação e a sua característica essencial. Este último aspecto da Realidade Única é também simbolizado pelo termo “Grande Sopro”, símbolo bastante sugestivo para necessitar elucidação. Assim, o primeiro axioma fundamental da Doutrina Secreta é esta Única e Absoluta Asseidade metafísica, que a inteligência limitada representou na Trindade teológica.
SEGUNDA
A Eternidade do Universo, no total, como um plano sem limites; periodicamente o “cenário de Universos inumeráveis que se manifestam e desaparecem incessantemente”, chamados “Estrelas que se Manifestam” e “Centelhas de Eternidade”.
“A Eternidade do Peregrino” é como um abrir e fechar de olhos da Existência-em-si-Mesma, como diz o Livro de Dzyan. “O aparecimento e desaparecimento dos Mundos são como o fluxo e o refluxo periódicos das marés”.
Esta segunda asserção da Doutrina Secreta é a absoluta universalidade desta lei da periodicidade, de fluxo e de refluxo, de maré enchente e vazante, que a ciência física tem observado e registrado em todos os domínios da Natureza. Alternâncias como Dia e Noite, Vida e Morte, Sono e Vigília, são um facto tão comum, tão perfeitamente universal e sem excepção, que é fácil de compreender porque aí divisamos uma das Leis absolutamente fundamentais do Universo.
TERCEIRA
A identidade fundamental de todas as Almas com a Super-Alma Universal, sendo esta última, ela própria, um aspecto da Raiz Desconhecida; a peregrinação obrigatória de todas as Almas, centelhas daquela Super-Alma, através do Ciclo de Encarnação (ou da “Necessidade”), de acordo com a Lei Cíclica e Cármica, durante todo esse período. Por outras palavras: nenhuma Buddhi (Alma Divina) puramente espiritual pode ter uma existência independente e consciente antes que a centelha saída da pura Essência do Sexto Princípio Universal – isto é, da Super-Alma - tenha (1) passado através de cada forma elementar do mundo fenomenal deste Manvantara e (2) adquirido a individualidade, primeiro por impulso natural e depois à custa dos próprios esforços conscientemente dirigidos (e regulados pelo seu Karma), percorrendo assim todos os degraus da inteligência, desde o Manas mais baixo até ao mais elevado, do mineral e da planta até ao Arcanjo (Dhyāni-Buddha) mais santo. A doutrina axial da Filosofia Esotérica não admite privilégios, nem dons especiais, no homem, salvo os que o seu próprio Ego conquistou pelo esforço e mérito pessoais no decurso de uma longa série de metempsicoses e reincarnações.
Tradução de Belarmino Brito
* * *
Estas notas de Robert Bowen, em boa hora traduzidas pelo nosso amigo Belarmino Brito, contêm indicações preciosas para o estudo do esoterismo e, muito particularmente, de “A Doutrina Secreta”, a obra incomparável de Helena Petrovna Blavatsky (HPB). Foram registadas três semanas antes da morte de HPB. Nelas ressalta a oposição da própria HPB a que ela fosse idolatrada ou a que a sua obra fosse “decorada” e repetida como letra morta. Tal representa uma honestidade exemplar, contrastante com as basófias de inúmeros pseudo-gurús contemporâneos. No entanto, não confundamos: ela é assertiva sobre a importância do estudo e de Jnana (Conhecimento Espiritual), bem como acerca do travejamento fundamental da Sabedoria Esotérica. Não incita, de modo nenhum, à fuga agnóstica, a-jnânica e anti-conhecimento, vigente em círculos esotéricos (incluindo teosóficos, infelizmente), tendo até alertado contra a preguiça mental. O seu legado literário de modo nenhum pode ser colocado no mesmo patamar que as mistificações, banalidades e insânias pseudo-esotéricas – do género “Conselho Reikiano InterGaláctico” (!!!!!!!!!!!) – que proliferam na actualidade.
José Manuel Anacleto
(1) Note-se que, na “Doutrina Secreta”, Helena P. Blavatsky apresenta períodos muito mais vastos para todas as sub-Raças já volvidas. Pensamos, pois, que Robert Bowen não terá entendido bem este ponto (ou que HPB omitiu alguma palavra, por lapso), sendo provável que as Sub-Raças tenham a ver com o Ano Sideral mas em cômputos de tempo múltiplos da sua duração (Nota da Redacção).
(ESPAÇO HPB é uma secção da Biosofia dedicada a valorizar a importância da vida, da obra, dos ensinamentos, do exemplo e do significado presente e futuro de Helena Petrovna Blavatsky.)
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